Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


13-03-2000

O drama timorense e o drama brasileiro Por Sérgio Ávila Rizo


Quem acompanhou os noticiários internacionais dos últimos meses, observou o assassinato indiscriminado de seres humanos numa pequena ilha do Pacífico chamada Timor.

O drama desta ex-colônia portuguesa é aterrorizante e não se resume às poucas e inconsistentes linhas publicadas nos jornais brasileiros. Desde 1975 - ano em que foi deposto o regime ditatorial português colocando fim ao colonialismo - a violência fez parte do cotidiano timorense e resultou num significativo número de vítimas: cerca de 200.000.

Não estamos falando de mortes típicas de guerra (através de tiros ou bombas), mas sim de mortes causadas também pela fome e tortura (física e psicológica). Relatos de sobreviventes informaram o verdadeiro inferno promovido pelos militares indonésios, com direito a mutilações, violação de mulheres e crianças, tudo isso realizado geralmente nas aldeias, na frente dos familiares. Eram mulheres sendo estupradas na frente de seus maridos e filhos, homens sendo cruelmente torturados frente suas esposas e filhos. Se você acha que as últimas linhas foram muito fortes, então imagine agora vivenciar isto cotidianamente.

É meu amigo, isto ocorreu durante muito tempo e não começou ontem não, o que começou ontem foi o noticiário a respeito desta causa, mais precisamente em 1996, com o prêmio nobel da paz concedido a Ramos Horta e a D. Ximenes Belo por denunciarem o que o mundo não sabia que existia ou não queria saber que existia. Vale ressaltar a divulgação do plebiscito de 30 de agosto, onde 78,5% dos heróicos eleitores timorenses votaram a favor da independência, mesmo sofrendo represálias pelos grupos paramilitares indonésios.

Percebemos então o importante papel da mídia para informar, conscientizar e promover a verdade. Desde 96 Timor começou paulatinamente a aparecer na mídia, e assim inúmeros grupos de solidariedade começaram a se formar pelo mundo. Seria ingenuidade dizermos que a liberdade atual de Timor é expressamente produto da solidariedade internacional, pois estaríamos esquecendo as questões políticas, militares e econômicas que desencadearam a crise indonésia no final do ano passado, mas, com certeza, se não fosse a comunidade internacional auxiliando os timorenses na diáspora, divulgando a causa aos órgãos políticos competentes, talvez a pressão para a resolução do problema não fosse tanta, e os timorenses ainda estivessem sofrendo. Pare para pensar então em quantas nações foram exterminadas sem que sobrasse ao menos um indivíduo para contar a história. Quantas estão sendo dizimadas neste exato momento sem que haja microfones e câmeras.

Não é preciso ir muito longe para comprovar isto, basta tomarmos por exemplo os índios brasileiros. Objetivamente: historiadores e antropólogos, através de pesquisas, afirmam que na época do "descobrimento" existiam cerca de 3 milhões de índios somente na bacia amazônica, hoje resumem-se aos parcos 210.000 detentos deste cárcere capitalista - diga-se de passagem que o Brasil é o país com a 5ª maior extensão territorial do mundo.

Todos os índios do Brasil cabem em 2 Maracanãs lotados.

Enquanto isso, uma das maiores emissoras de TV do mundo promove euforicamente a campanha "Brasil 500 anos". Eu pergunto, 500 anos do quê?

A verdade é uma só: o sistema sócio-econômico vigente sobrevive às custas da alienação e produz consumidores ao invés de cidadãos. A mídia brasileira não promove o senso crítico em seus telespectadores e impõe o comportamento e o consumo. Pergunte às pessoas o nome dos principais apresentadores de TV e depois o vereador em que ela votou e entenderás o que quero dizer...

Enquanto as glórias do país forem "Ronaldinhos", "loiras do pagode" e outros ícones desta indústria cultural fajuta, continuaremos criando alienados, pois se por um lado a publicidade e o consumo vão muito bem obrigado, por outro, o ensino público . . .

Assim, a divulgação dos problemas nacionais e internacionais vão sendo sucumbidos aos interesses de um sistema que não foi feito por todos, mas reflete em todos.

Se foram necessários 25 anos para que o mundo intervisse por Timor quantos anos serão necessários para destruir o exército de alienados do mundo? Quantas nações serão necessárias ser dizimadas? Quantos animais, quantas árvores . . .

Texto Sérgio Ávila Rizo (Geografia USP)
Revisado por Luiz Claudio C. de Melo (Publicidade ESPM)