Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


22-06-2022

ESCÂNDALO DE ANTISSEMITISMO NA DOCUMENTA (D15) António C Justo


Também a Arte tem Limites e não chega apagar as Indignações

A exposição mundial (D15) encontra-se sob o fogo da crítica geral na Alemanha. É acusada de antissemita e com razão. O facto de a organização da D15 só ter apresentado o painel do escândalo ao público (com uma cena antissemítica) no sábado depois dos jornalistas já terem partido (cerca de 3.000 jornalistas tinham visitado a Documenta nos dias anteriores para eles reservados) dá razão para suspeitar da intenção propositada.

O painel monumental, em frente do Pavilhão-Documenta no Friedrichsplatz, foi desmontado devido a estereótipos pejorativos antissemitas que se encontram num pormenor da tela. A obra do grupo artístico indonésio Taring Padi apresentava uma figura onde um judeu (reconhecível pelos seus caracóis) com runas SS no chapéu e mostra também tropas da Mossad com Estrelas de David e focinhos de porco...

O extremismo apresentado num ponto do painel vira o feitiço contra o feiticeiro:  a crítica que pretendiam fazer à sociedade em geral recebem-na como ricochete sem que haja uma reflexão sobre os outros temas importantes do painel! Neste proceder não se passa além do círculo vicioso de crítica à crítica! Perante tanta pressão o painel foi retirado e o grupo Taring Padi pediu desculpa por qualquer ofensa causada pela obra...

O extremismo, a violência de poderosos e uma certa antropofobia lematizadas na tela parecem ganhar cada vez mais espaço no meio da nossa sociedade; a violência estrutural e a violência individual e da arte encontram-se concretizadas, de maneira exemplar, no retratado na tela e no que acontece em torno dela. Enfim, política e socialmente, encontramo-nos todos envolvidos num mesmo jogo que se repete e assim vai dando sustentabilidade às forças sociais (críticos e criticados) que se sucedem e repetem. Na D15 colidem dois mundos diferentes e com expressões diferentes: o mundo do sul representado no colectivo Ruangrupa (grupo indonésio que tem a cargo a direcção artística da D15) e o mundo do Norte onde a exposição mundial se realiza com uma mundivisão própria e costumes culturais próprios. A liderança da D15 tem uma tarefa difícil, que seria reconciliar o mundo muçulmano com o Ocidente no que toca à relação com Israel! A solução para a liderança artística seria que esta tomasse a iniciativa de, como colectivo artístico, fazer uma declaração explícita defendendo a existência de Israel.

Talvez a tela pintada seja não só expressão do “racismo” inerente ao homem e às culturas, mas também um símbolo da documenta 15 e, quem sabe, uma imagem de um mundo que nega reconhecer-se a si mesmo!

Todas as Documentas a que assisti desde os anos oitenta revelam o estado da sociedade ocidental que nos seus actores se poderá reconhecer uma missão de desconstrução de um passado histórico que em vez de corrigido e melhorado se pretende irradiado. A Europa encontra-se numa fase de mera autoadministração, sem perspectiva espiritual e sem mensagem para si nem para o mundo.

O grupo artístico indonésio perde toda a razão ao servir-se de antissemitismo ou racismo para denunciar Administrações e elites partidárias, corporações internacionais e movimentadores financeiros globais que longe do cidadão, determinam as condições de enquadramento em que podemos querer, agir e pensar!

Na realidade, não basta desenvolver simpatia pelos oprimidos e desfavorecidos para se ter razão nos meios que se usam e nas críticas que se fazem...

 

António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e Pedagogo

Texto completo em Pegadas do Tempo, https://antonio-justo.eu/?p=7631