Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


01-02-2003

O que eu roubei dos Açores Francisco Santos Neto


Por Francisco José dos Santos Neto - Xico Xadrez

Em 2001, concretizei um sonho de infância. Quando garoto, entre leituras de Homem-Aranha, operação nos pés para correção, estudos escolares e, às vezes, um tabuleiro de xadrez, ouvia meu irmão Rich falar do Reino dos Sonhos.

Já adorava Cecília Meireles e seus poemas. Mas, meu irmão Rich (antes era Ricardo) falava com autoridade. Ele iria viajar pelo mundo afora. Um dia ele iria viajar pelo mundo afora. Mas, naquela década de 70, ele me falava de um local tão longe de onde a gente veio, que era o mais belo local do mundo, ali se confundia com o paraíso e lá as pessoas eram felizes, a Natureza exuberante, vistosa, gloriosa. Será que isto era verdade? No meio da adolescência e formação de caráter, ia perguntando: existe algum local tão bom e prazeroso assim no mundo. Depois veio a faculdade. Ia fazendo alguns versos. Meu irmão mudou de país. Foi para Suíça. Alemanha, Hong Kong, sei lá. Fiquei com saudades...

Os anos foram passando. Os anos foram passando. Os anos foram passando. Eu pensava que nunca iria encontrar-me com aquela criança, que precisava ser despertada. Meu irmão longe, nunca mais voltou, mas o que ele deixou, ficou no meu coração.

Quando cheguei aos Açores, para realizar estes sonhos de menino, parecia que tudo era encontrado. O adulto que há em mim se deleitava com esta realidade palpável.

Em 2001, concretizei um sonho de infância.

Alguns sonham ir a República Dominicana. Eu sei. Outros a Miami e Disneyword. Eu só queria ir aos Açores. Quando aportei em Madalena, vislumbrando a Ilha do Pico, quando encontrei o presidente Carlos César e sua mulher Ana Luisa César. Quando inebriei-me com o vulcão. Quando via o Pico, maior montanha de Portugal, entrelaçado com tantas belezas no litoral e arredores. Vou esquecendo alguns nomes. Vou lembrando outros. Alzira Silva, esta gigante assessora, diretora regional das comunidades, que teima em divulgar seu mundo para todos outros mundos. Desta vez mandou-me um CD, com poesias de Alfred Lewis, que ainda nem agradeci. Mas, quero agradecer aqui, muito obrigado...

Tinha aquelas senhoras fazendo artesanato que chorava, pois só de olhar a beleza daquelas obras maviosas, as lágrimas saiam devagarinho. Fui entrevistado numa rádio naquela Ilha. A rádio era modesta, mas a luta daquela menina, jovem repórter, era de gigante. Ilha do Pico, como vou esquecer de ti. Ilha do Pico, como vou esquecer de ti.

Uma senhora do Canadá emocionou-me tanto. Pediu que eu contasse esta história. E nem lembro do nome dela agora. Vi brasileiros trabalhando por lá. Foi também minha primeira viagem internacional, vocês precisam saber. Fui com o coração na mão.

O que eu roubei dos Açores, vocês devem estar a perguntar. Eu roubei os Açores inteiro. Ele está no meu coração e se traduz numa frágil solidão.

Solidão que se acalma quando lembro a Festa do Divino Espírito Santo. A sacola que estou usando há dois anos neste Triângulo Mineiro (que não é só um, são tantos). Como são tantos os Açores que me envolvem e nos seduzem. A Festa do Santos Cristo dos Milagres, quando vou participar, é em maio. Estou com a foto, que me inspira tantos. Aliás, estou com tantas fotos que só me fazem chorar. E, ainda ando com a velha sacola dos Açores.

Em 2001, concretizei um sonho de infância.

Este apoio do governo açoriano, aliado a presidente do Elos Clube de Uberaba e famosa lista de amigos fizeram com que eu realizasse um sonho. O que meu irmão fez quando eu era pequeno, hoje faço com muita gente. Conto dos Açores, como estou fazendo para quem estiver lendo. Hoje, estou com um pasta menos surrada... dos Açores!

Conto tudo que passei. E ainda estou passando. Lembro de Audrey, que quando a olho, não estou olhando para ela, é o Havaí inteiro que passa a descoberto sobre mim. Ela é o próprio Havaí. Eu tive a felicidade de encontrar o Havaí nos Açores. Agora, além da nostalgia pelo Açores, tenho vontade de conhecer o Havaí. Ouvir o programa da preclara que fala tanto sobre as comunidades e os países que têm uma herança comum: a língua portuguesa, que tantos dizem é difícil, mas que nossos corações nunca renegam.

Nossos corações nunca renegam porque ela é um canto que une Açores a Fernando de Noronha, Cabo Verde a Angola, Guine Bissau a São Paulo, Dili a Coimbra, o Rio de Janeiro a Lisboa.

Este mesmo canto une todas estas ilhas, que já não são mais ilhas. Formam um só coração. E, como uma gaivota, fica a sobrevoar nosso pensamento. Esta gaivota parece que vai de Flores a Santa Maria, como eu fui do Pico para São Jorge e fiquei passado de ver tantas brumas. Lá, quase pirei, mas quero voltar. São Jorge, meu santo guerreiro, quantas belezas você guardou para mim. O navio levava a todos daquele abençoado curso de 2001: Açores – A Descoberta das Raízes. Eu estava lá no meio de tanta gente famosa, parece que ia ficando famoso também. E, inspirei-me é claro. Fiz muitos poemas sobre os Açores. Aquela inspiração de jovem estudante de jornalismo voltava inteira.

Como volta agora em cada linha que escrevo. Como é grande o meu amor pelos Açores não vai possível contar tudo em poucas linhas.

E o Faial que Maria Eduarda Fagundes Nunes ensinou-me amar antes de viajar. Antes de cruzar o Atlântico todo para chegar. Ela nasceu no Faial. O que vou falar daquelas belezas, daquelas dunas. Registrei algumas fotos que talvez contem mais do que tantas palavras. Tive a felicidade de trazer seu livro, Maria Eduarda. E foi o poeta açoriano Avallacorba, que doou-me o livro. Bebemos algum licor na Ilha e conseguimos no rever em Ponta Delgada.

Ponta Delgada, do Sr. Estrela, que brilha mais que elas. Isto traz vontade de estar lá. Do Sr. Fernando Nunes e Marilda, que sabem receber tão bem. O Senhor Fernando Nunes preside a Federação de Xadrez dos Açores.

Mas, não é hora inda de falar de São Miguel. Acho que há mais sobre Madalena, suas praças singelas, suas sinfonias, madrugais e festas. Penso que se meu coração á açoriano, preciso explicar o porquê.

Eu nunca desisti de ir até lá. O sonho de criança foi sendo acalentado. Parece que tudo foi programado para que em dado momento da vida fosse encontrar-me com tais valores. Os nomes estão me escapando. Vou acabar lembrando.

Sei daquele telefone extemporâneo. Me tirando do trabalho cotidiano. Parece que as coisas tinham que acontecer daquele jeito. No entanto, tive que ter vontade firme e utilizar todos meus recursos, que eram poucos, mas viraram muitos.

Agora, procuro um gesto. Procuro um novo elo. Meu testemunho pode ser útil. Mas, não considere fogueira de vaidades. Pode ser um elo que vai se unir a um outro elo que se une a outro. Sempre vou lembrar-me que os Açores é uma construção que vai além de seu espaço geográfico. Mora em cada um de nós. Mora em meu sonho de menino de 30 anos atrás.

Francisco José dos Santos Neto (xicoxadrez@hotmail.com), uberabense, conselheiro do Elos Clube, viajou aos Açores em 2001, em curso voltada para as comunidades, a convite do governo açoriano