Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


25-09-2013

Os Portugueses de Hoje no Brasil António Viriato


Os Portugueses de Hoje no Brasil

António Viriato

Passou na RPT 1, mais um episódio do programa «Portugueses no Mundo», que costumo ver, com interesse e, algumas vezes, com bastante agrado.

Nele se mostram compatriotas nossos que por necessidade ou espírito de aventura se fixaram nas mais variadas partidas do Mundo, dando continuidade a uma tradição que radica no longínquo século XV, quando os Portugueses, conquistada e reafirmada a sua independência política na Península Ibérica, saíram barra em fora, em todas as direcções, pelo largo Atlântico, em cata de novas terras e novas gentes.

Julgo não ser em vão que se ouvem tantas narrativas da expansão portuguesa no Mundo, nomeadamente, da lusa epopeia marítima quinhentista. Ter-se-á criado, assim, uma predisposição natural no nosso espírito, para buscar a sorte noutras paragens.

Nos tempos que correm, as dificuldades económicas aguçarão certamente tal disposição.

O progama referido já nos levou a locais muito diversos, da Europa, à África, Ásia, Américas e Oceania.

Ontem, o local de fixação dos portugueses era o Rio de Janeiro, como há umas semanas havia sido São Paulo.

Os entrevistados são normal mente jovens da mais recente vaga de emigrantes, alguns até trabalhando em lugares de destaque, no plano económico e social, visivelmente bem integrados, demonstrando bom conhecimento da vida local.

Em várias ocasiões, porém, vêmo-los a mudarem a sua pronúncia de origem quando se dirigem a brasileiros. Alguns confessam mesmo que se atrapalham quando telefonam para casa, ao reassumirem a sua primitiva forma de falar. E é isto que me intriga.

Procederão assim os portugueses porque genuinamente aderem à pronúncia brasileira, mais clara na distinção dos sons, mais perceptível na articulação das palavras ou tal prática resultará de uma qualquer pressão social ou relutância brasileira em entender as falas portuguesas ?

Custa-me a entender as razões deste fenómeno, visto que entre nós vive hoje numerosa colónia brasileira, que percebe rapidamente a nossa maneira de falar, de pronunciar as palavras, sem que tenhamos de lhes falar à sua maneira, para sermos compreendidos.

Ignoro como se sentirão, neste aspecto, os portugueses radicados no Brasil, mas o seu comportamento parece-me sempre algo estranho, denotando falta de personalidade, complexos de qualquer ordem, que os leva a modificar a sua forma original de falar.

Em Portugal continental e insular, apesar da comparativa exiguidade territorial com relação ao Brasil, coexistem pronúncias marcadamente diferentes entre si.

Compare-se, por exemplo, a forma de falar de um minhoto, com a de um alentejano, a deste com a de um transmontano ou com a de um açoriano, de S. Miguel, sobretudo, por ser a mais vincadamente diversa, com a de um beirão, setubalense, algarvio, madeirense, etc., todas elas com as suas especificidades claramente distintivas.

Nada disto obsta a que estes portugueses quando se desloquem no espaço nacional se consigam todos entender entre si, sem necessidade de imitação da pronúncia dos seus interlocutores das diversas regiões.

Reconheço algumas particulares dificuldades, com algumas destas pronúncias, porque eu próprio as experimentei ao chegar aos Açores, a S. Miguel, para aí permanecer cerca de quatro meses ministrando a recruta, como Oficial Miliciano do Exército, a mancebos recém chegados à Intituição Militar.

Logo à saída do aeroporto de Ponta Delgada ao dirigir-me a um natural fiquei estupefacto pela sua pronúncia cerrada, que me deixou quase completamente desentendido com o que lhe escutara.

Em pouco tempo porém, em contacto contínuo com os micaelenses, essa estranheza inicial estava ultrapassada e nunca me vi na necessidade de me pôr a falar à sua maneira para me fazer entender.

Ora se isto se passa no espaço nacional, de tão ricos cambiantes quanto a pronúncias e modos de falar, diversos na acentuação das palavras, no ritmo do discurso e até nas pequenas divergências vocabulares, por que motivo os portugueses no Brasil alteram a sua maneira de falar, imitando a fala brasileira ?

Poucos são os que resistem, sendo justo reconhecer que alguns artistas, principalmente, o fazem, com o cómico Ricardo Araújo Pereira à cabeça, a quem vi ser entrevistado no programa de Jô Soares, falando sempre da sua maneira habitual. Outros também o têm feito e assim deve ser. Cada terra com seu uso, cada roca com seu fuso, como corre o refrão.

Assim como em Portugal achamos natural ouvir um brasileiro a falar à sua maneira e o compreendemos normalmente, salvo se usar termos de calão ou regionalismo particular, também no Brasil um português dever ser entendido na sua fala natural.

Só a invulgar falta de contacto do Brasil com a cultura portuguesa pode explicar o seu alheamento ou a sua dificuldade em perceber o português europeu normal, exceptuando certas formas nossas de falar desleixadas, atabalhoadas, em resultado de uma deficiente aprendizagem da Língua, em casa, na família e na Escola, que, com frequência, não corrige, não insiste na boa dicção, quando, logo nas primeiras letras, as crianças se iniciam na leitura do Idioma pátrio.

E este é, de facto, um problema grave, no ensino da Língua, que se tem acentuado nas últimas décadas, pela generalizada e persistente incúria que permeia todo o nosso sistema educativo, bem patente na forma de falar das novas gerações, caracterizada pelo uso de vocabulário restrito, cheio de repetições enfadonhas de termos e de expressões, o que, no domínio da Língua, comprova a sua deficiente formação escolar.

Muito haverá aqui para fazer, como evidentemente noutros sectores da vida nacional, mas para isso é preciso que os presentes problemas comecem por ser bem identificados pelos responsáveis, para que depois se empenhem na sua resolução, se acaso os reconhecem como merecedores do seu esforço e do seu engenho, virtudes ordinariamente escassas, como temos repetidamente confirmado.

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