Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


25-09-2013

Os Segredos de N. Srª da Glória do Outeiro Vitor Manuel Adrião


OS SEGREDOS DE N.ª SR.ª DA GLÓRIA DO OUTEIRO

Vitor Manuel Adrião

 

Celebrada a 15 de Agosto neste seu templo no Outeiro da Glória, Nossa Senhora tem aqui a celebração mais faustosa do Rio de Janeiro e mais misteriosa praticamente de todo o Brasil. Neste antigo Morro do Leripe ou Uruçumirim o fundador da cidade do Rio de Janeiro, Estácio de Sá, encontrou a morte em 20.1.1567 ao expulsar os franceses daqui e do Brasil acabando de vez com o projeto francófono “França Antártida”, e o fez ao lado do seu grande amigo António Mariz Coutinho, sesmeiro na Praia Grande, atual Niterói. Seria António Mariz a promover e a instalar o culto à Virgem Maria neste morro, mandando que uma companhia portuguesa previamente escolhida de frades capuchinhos (franciscanos, portanto) a celebrassem doravante conforme a regra da sua Ordem. Assim o fizeram, mas encobrindo sob os símbolos confessionais a mensagem heterodoxa da Tradição Oculta sob a legenda latina Maris Nostra (“Nossa Mãe”), donde derivou Magistra Nostra (“Nossa Mestra”) e que se retrata no simbolismo hermético da viagem marítima (simbólica da ação criadora do Espírito Santo) que, aliás, está representada nesta igreja nos dois santos nos altares colaterais que também foram marinheiros: Gonçalo (esq.) e Amaro (dir.).

A devoção a Nossa Senhora da Glória começou em 1608, quando um certo Ayres (possivelmente ermitão capuchinho) depôs uma pequena imagem da Virgem na gruta natural que existe no morro, e a sua fama aumentou consideravelmente em 1671 quando um outro ermitão, natural de Aveiro, António Caminha, esculpiu a imagem da Virgem em madeira e ergueu uma pequena ermida junto dessa gruta do Leripe. Ele esculpiria uma outra imagem que mandaria para D. João V de Portugal e está hoje na igreja de S. Sebastião de Lagos, no Algarve. As terras compreendendo o Outeiro chamavam-se Chácara do Oriente e pertenciam a Cláudio Gurgel do Amaral, que os doou a Nossa Senhora em escritura pública de 20.6.1699 com a condição de ser edificada uma capela permanente e nela ser sepultado com os seus familiares e descendentes.


A partir da ermida no Outeiro da Glória foi construída a atual igreja entre 1714 e 1739, sendo o seu projeto atribuído ao tenente-coronel português José Cardoso Ramalho. Este projetista andaria de proximidades aos conhecimentos herméticos da época como se denota na estranha planta do templo composta por dois octógonos (um ocupando a nave curva da igreja e outro a sacristia) que lhe dão forma de um 8. Para os antigos cabalistas cristãos o oito era simbólico da Divindade intermediária entre o Mundo Divino e o Mundo Humano a qual unia a ambos como Glória do Céu (algo equivalente à Shekinah da Cabala judaica, ou seja, a “Manifestação Real de Deus”), e as suas formas elípticas sugeriam a mensagem hermética de “o que está em cima (no Céu) é como o que está e baixo (na Terra)”. Ora Nossa Senhora, representação do arquétipo da Grande Mãe Celeste, sempre foi considerada a mediadora entre o Céu e a Terra, a intercessora da Humanidade junto ao Filho e ao Pai, exercendo assim a função salvífica de Espírito Santo, aliás, retratado no altar-mor desta igreja – e até no aparelho de azulejaria setecentista retratando cenas bíblicas do Cântico dos Cânticos – cuja pedra utilizada na sua construção proveio da Pedreira da Glória, no Morro da Nova Sintra, no Bairro do Catete. Esse formato geral da igreja, de dois octógonos com torre na entrada, não tem antecedentes no Brasil e os seus antecedentes em Portugal envolvem-se nos mistérios na arquitetura sagrada atribuída aos monges-construtores medievais, beneditinos e franciscanos, que andaram próximos da Ordem dos Templários cujos conhecimentos secretos mantêm-se assim até hoje.

 

No altar-mor da Nossa Senhora da Glória vê-se no topo o Divino Espírito Santo em resplendor e mais abaixo a representação do Santo Vaso identificado nas crônicas medievais como Santo Graal, o repositório do Santo Sangue que antes servira na Última Ceia a Jesus Cristo. Defronte à mesa dos sacrifícios, o altar, veem-se duas colunas representando aquelas na entrada do antigo Templo de Salomão chamadas Bohaz(“Rigor”) e Jakim (“Conhecimento”), termos fazendo lembrar aqueles sânscritos Bhakti (“Devoção, Amor”) e Jnana (“Conhecimento, Sabedoria”), afinal, os predicados do caráter e da cultura superiores do igualmente superior Homem Espiritual ou Adepto Perfeito, igualmente identificado pela sigla B. J., que os ocultistas orientais identificam como Bhante-Jaul, isto é, “Irmão de Pureza”, tal qual eram os primitivos capuchinhos mandados vir para este outeiro por António de Mariz.


A família real portuguesa tinha especial predileção por esta igreja, e desde 1819, quando a princesa Maria da Glória foi aqui consagrada pela mão de seu avô, o rei D. João VI, que todos os membros da Casa de Bragança nascidos no Brasil eram consagrados neste templo. O decreto-lei de 25.4.1937, governando Getúlio Vargas, declarou “monumento nacional” a igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, e em 1.1.1950 o Papa Pio XII conferiu-lhe o título de Basílica Nacional da Assunção.

 

V.M.A.

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