Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


26-04-2014

A problemática das nacionalidades portuguesa e angolana




Temos vindo a assistir actualmente à chegada a Angola de muitos cidadãos portugueses, muitos dos quais afectados pelo severo ambiente económico no seu país, reclamam pela nacionalidade angolana com argumentos de terem nascido em Angola antes da independência do Estado angolano.Eles alegam que, à luz do registo civil, têm direito a obtenção da nacionalidade angolana. Se do ponto de vista lógico essa possibilidade é evidente, não o é, porém, na perspectiva jurídico-legal, nos termos em que vamos a debitar mais abaixo.

É sabido que antes de 11 de Novembro de 1975, altura em que Angola se tornou independente de Portugal, por força do fim da colonização, os angolanos eram considerados cidadãos portugueses por direito (para aqueles que não chegaram a obter registo civil e a constituir a respectiva nacionalidade por via documental) e nesse contexto podiam reclamar da nacionalidade portuguesa constituindo-se cidadãos de Portugal no pleno gozo dos seus direitos. Mesmo depois do nascimento da República Popular de Angola, os angolanos podiam até 1978 reclamar esse direito, visto que Angola tinha sido uma província de Portugal ao tempo da colonização.O mesmo já não se pode dizer dos portugueses que tendo nascido em território angolano antes da independência tenham abandonado o território por altura da independência (ainda que tempos depois) sem constituir o respectivo vínculo de nacionalidade. E porquê? A resposta de completa lógica infantil é de que Angola não existia como Estado. Era precisamente uma província de Portugal e como tal quem tenha nascido antes de 11 de Novembro de 1975 em Angola nasceu na República Portuguesa, com plenos direitos de cidadania se constituiu juridicamente o vínculo de nacionalidade. Ou seja, não faz sentido que um cidadão português nessas condições alegue ter nascido angolano, como cidadão (embora tenha nascido na província portuguesa de Angola).O que é facto é que os angolanos que tenham obtido nacionalidade portuguesa por altura da colónia de Angola (província ultramarina) são cidadãos portugueses de pleno direito, salvo se a legislação portuguesa sobre a nacionalidade tenha colocado entraves expressos nesse sentido. Podem reclamar deste estatuto, na medida em que o Estado português colonizador é o mesmo que existe nos dias de hoje conservando o vínculo de cidadania de todos os cidadãos nascidos durante a colonização. Os angolanos nesta condição, sim, podem reclamar a nacionalidade portuguesa. O contrário é que é inadmissível por força dos limites colocados pela Lei da Nacionalidade angolana, também conhecida pela Lei n.° 13/91, de 11 de Maio (com a nova redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 1/05 de 1 de Junho – que estabelece as condições de atribuição, aquisição, perda e reaquisição da nacionalidade angolana). Nos termos desta Lei (LN), a nacionalidade pode ser de origem ou adquirida (art.° 2.°). Adquire-se a nacionalidade de origem quando o indivíduo tenha nascido em Angola sendo os pais de nacionalidade angolana ou tendo nascido no estrangeiro seja filho de pais de nacionalidade angolana.No primeiro caso, o critério de atribuição legal é conhecido por ius soli (direito adquirido pela via do nascimento no território angolano - com a extensão que lhe dá o direito Internacional Público abrangendo o nascimento a bordo das aeronaves e embarcações navais de matrícula (bandeira) angolana, mesmo sulcando os céus e mares além do território geográfico angolano, sem excluir os recintos abrangidos pelas embaixadas angolanas no exterior).No segundo caso, o critério de atribuição é conhecido por ius sanguinis (direito adquirido pela via da relação parentesca - vínculo de sangue - que liga o indivíduo aos pais angolanos). Nos dois casos, a nacionalidade é atribuída desde o momento do nascimento do indivíduo seguindo a tramitação imposta pelas leis de registo civil. Vale frisar que o recém-nascido exposto em território angolano (não se sabendo ao certo em que local - território - efectivamente terá nascido (pense-se num bebé fresco de dias que tenha dado entrada em território angolano de modo fraudulento e sem o conhecimento das autoridades), presume-se de nacionalidade angolana, até que se prove que não nasceu em Angola. Seja pela via da terra (ius soli), seja pela via de parentesco (ius sanguinis), a nacionalidade assim adquirida é considerada plena e ingressa o indivíduo a categoria de cidadão nacional gozando dos correspondentes direito constitucionais.Quanto à nacionalidade adquirida, esta pode beneficiar qualquer estrangeiro que pretenda ser nacional de Angola desde que obedeçam os limites e condições impostas pela LN. Assim, «...pode ser concedida aos filhos menores ou incapazes de pai ou mãe que adquire a nacionalidade angolana e que tal solicitem, podendo aqueles optar por outra nacionalidade quando atingirem a maioridade.» (art.° 10.°). Neste caso diz-se «nacionalidade adquirida por motivo de filiação». A nacionalidade também pode ser adquirida por adopção (art.° 11.°). É o caso de um indivíduo que venha a ser adoptado por pais (obviamente, não biológicos) angolanos desde que cesse o vínculo de filiação com os respectivos pais biológicos – extinção do vínculo com a família natural (assim determina a lei angolana) com a ressalva da situação que a própria LN estabelece.A aquisição da nacionalidade pode ainda ocorrer pela via do casamento (art. 12.°). Neste caso, o casamento entre o estrangeiro e o nacional tem de ser celebrado validamente há mais de 5 anos como pré-requisito para a obtenção da nacionalidade. Nos termos da LN, o estrangeiro casado com o nacional pode obter a nacionalidade angolana sem completar os 5 anos, ou seja, a qualquer momento depois da celebração do casamento válido, se por virtude do casamento perder a sua nacionalidade originária. Finalmente, a nacionalidade pode ser adquirida por «naturalização» (art.° 13. °). Aqui o Estado angolano, através do Executivo (interpretação correctiva da LN que estabelece o Conselho de Ministros), pode conceder a nacionalidade angolana ao estrangeiro que o requeira e a data do pedido, satisfaça «cumulativamente» as seguintes condições: a) ser maior perante a lei angolana e a lei do Estado de origem; b) residir habitual e regularmente em Angola há pelo menos 10 anos; c) Oferecer garantias morais e cívicas de integração na sociedade angolana; d) Possuir capacidade para reger a sua pessoa e assegurar a sua subsistência. Percebe-se da LN que os estrangeiros menores, incapazes ou sem rendimentos regulares estando a viver em Angola, ainda que no prazo mínimo de 10 anos, não podem ser naturalizados como angolanos.A Assembleia Nacional (ou o Executivo mediante autorização da Assembleia Nacional) pode conceder a nacionalidade angolana a estrangeiro que tenha prestado ou possa prestar serviços relevantes ao País ou ainda que demonstre qualidades profissionais, científicas ou artísticas excepcionais. Para estes casos serve o exemplo da naturalização de estrangeiros para servirem as selecções nacionais em competições desportivas.Para a obtenção da nacionalidade por naturalização, o interessado deve manifestar-se mediante requerimento seguindo um processo organizado nos termos do regulamento correspondente. A LN estabelece ainda outros casos de aquisição da nacionalidade angolana (art.° 14°): a) o indivíduo nascido em território angolano quando não possua outra nacionalidade (Pense-se, como exemplo, num recém-nascido que tenha chegado ao mundo numa aeronave ou embarcação de matrícula angolana e que venha a desembarcar com os seus pais - estrangeiros - no estado de origem destes. Se os pais não o nacionalizam no seu Estado de origem, pode adquirir a nacionalidade angolana); b) o indivíduo nascido em território angolano filho de pais desconhecidos, de nacionalidade desconhecida ou apátridas. Dixit. Albano Pedro
Semanário Angolense, 19 de abril de 2014

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