Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


13-11-2014

Opinão de timorense-A complexidade da construção do Estado de Timor-Leste: o “roteiro” desigual Rojer Rafael Soares


A complexidade da construção do Estado de Timor-Leste: o “roteiro” desigual

Pelo Rojer Rafael Soares, Morada: Ailili, Manatuto

A construção do Estado de Timor-Leste envolve um processo de desenvolvimento gradual mas, simultaneamente, tem semeado um rumo desigual nos vários aspetos da sociedade timorense: sociopolítico; e económico e administrativo. Este facto contribui, igualmente, para acentuar a dualidade de duas conceções: moderno e tradicional. Uma única sociedade tem espelhado duas vivências societais com um ritmo de mudança também ele desigual. Senão vejamos, um sistema democrático significa uma sociedade mais aberta e recetiva à mudança, e Timor-Leste não é exceção, pelo que ao longo destes doze anos evoluiu passo a passo de acordo com os indicadores sociais, tendo por isso registado uma mudança social notável, com sentido histórico e institucional. Ainda assim, é de ressaltar que a par desta mudança, também se criaram problemas ou discrepâncias entre os aspectos social e económico, nomeadamente tem se apostado em políticas de cariz social descurando a produtividade económica e administrativa. Temos, assim dizer, mudanças a nível social e político mas a nível económico e eficiência da administração pública está muito aquém das expetativas criadas e que por isso mesmo não tem acompanhado esse ritmo, o que pode, na ausência de contributos teóricos e ideias para formulação de políticas públicas, ter consequências negativas para o nosso país. Passo especificamente a enunciar - algo que já é do conhecimento da maioria dos timorenses mas que ainda assim, a sociedade civil teima em projetar a crítica desmedida e pouco contibutiva em termos práticos – a dualidade de duas sociedades, uma sociedade de consumo/Díli e uma sociedade tradicional/áreas rurais assente numa economia de subsistência.                       

Repare-se que as mudanças ocorrem a uma velocidade muito dinâmica na medida em que exercemos um sistema político democrático, assim como estamos na presença de um mundo globalizado e capitalista, pelo que a mudança social é catapultada por fatores económicos, culturais e políticos, graças à maior difusão dos meios de comunicação e informação e partilha de ideias por via do forte avanço tecnológico. Não quero com isto dizer que devemos seguir, escrupulosamente, a imagem do cenário internacional atual, mas sim construindo o nosso Estado de acordo com a nossa realidade, reajustando as nossas prioridades e atento a nossa história, cultura e identidade. No plano nacional,  é mais que sabido que o isolamento de um país não é saudável nem aceitável, dado que o plano internacional exerce, direta e indiretamente, influências positivas ou negativas, nomeadamente  a concorrência económica estrangeira, a maior interdependência entre os Estados na resolução de problemas e cooperação de cariz regional e internacional, sendo por isso evidente a necessidade de construção do nosso Estado com uma base sólida, bem edificada e unificada pela união nacional de todos os timorenses. A unidade nacional foi, é e será sempre uma boa “arma” na defesa do interesse nacional, primando por um padrão de valores e atitudes sempre na base do respeito, zelo, partilha, responsabilidade, trabalho e dedicação a uma nação alcançada com esse mesmo  teor. Devemos, para isso, consolidar a conscencialização nacional na defesa do interesse nacional contra qualquer interferência estrangeira, bem como exercer os objetivos delineados no Plano Estratégico de Desenvolvimento Nacional, dado tratar-se de dois ingredientes-chave para o desenvolvimento sustentável, coeso e equatitativo do Estado de Timor-Leste.

Para tal, é bem salientar que o sistema timorense em geral tem apresentado progressos, bem como ainda manifesta uma baixa capacidade de resposta aos problemas e necessidades de desenvolvimento, afetados pelo fraco sistema de gestão, fiscalização e controlo dos programas e projetos executados ou a executar. Melhor dizendo, terá a Administração Pública contribuído o suficiente para o processo de desenvolvimento do Estado? De facto, o nosso problema reside numa Administração Pública pouco dinâmica e produtiva, ainda que se tenha feito um forte investimento na capacitação dos recursos humanos. Demonstrando-se, assim, que as mudanças a nível social são processadas mais rapidamente em relação à assimilação da formação e capacitação técnicas e à promoção económica e organizacional do sistema administrativo.

Os estudantes do ensino secundário que, durante este mês, sofreram uma intoxição alimentar pela ingestão da merenda escolar, revela uma situação lamentável e deve ser encarada como uma questão preocupante e de consciencialização para todos nós, reforçando a urgente necessidade de atenção com as gerações futuras, ou seja, com o futuro de Timor-Leste. 

Uma outra situação que tem contribuído para a desigualde social, é a disparidade dos salários entre os timorenses e entre o nacional e o internacional, começando pelo baixo salário minímo nacional, o seu possível aumento pode representar o incentivo à produtividade, sendo para tal necessário uma melhor distribuição salarial, bem como promover estratégias económicas sustentáveis, de modo atenuar o elevado indíce  de dependência da taxa de importações, com vista a aumentar o poder de compra de muitas famíias timorenses. E a diferença salarial entre o nacional e o internacional acentua a conceção de dicotomia entre os dois conceitos, associados a (des) valorização e/ou  (in) capacitação de um em detrimento do outro, que aliás tem sido perpetuada ao longo da história. 

Por outras palavras, é fundamental o reconhecimento da interdependência entre as políticas sociais e as políticas económicas, sendo que é aconselhável que percorram o mesmo ritmo de mudança, de modo a proporcionar um melhor equilíbrio entre as receitas e despesas do orçamento de Estado. Garantindo-se, igualmente, a balança comercial equilibrada através do investimento na economia e criação de emprego . 

Não quero transmitir aqui, uma ideia pessimista, muito antes pelo contrário, trata-se de uma interpretação realista, ao louvar os progressos que a nossa nação tem alcançado, pelo que é, igualmente, relevante identificar e avaliar os problemas que Timor-Leste ainda enfrenta para a promoção do seu desenvolvimento. E a luta continua!

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