Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


10-03-2005

Ao elista Nsungu Castelo - Margarida Silva e Castro


Margarida Silva e Castro *

“Ouço no mais íntimo de mim o canto de voz umbrosa das saudades./Será a voz antiga, a gota de sangue português que ascende do fundo dos tempos?/O meu nome que remonta às suas fontes” (In P oemas: Léopold Senghor, presidente e poeta do Senegal, Editora Grifo Edições, Rio de Janeiro,1969)

que.preservavas@herança.angolana
Se não for possível deixar às gerações vindouras algum patrimônio, ao menos lutemos, nós, os articulistas e intelectuais, para lhes deixar algo mais do que as nossas omissões involuntárias. P orque não há comparação entre o que se perde por fracassar e o que se perde por não ousar o mais difícil: falar do amigo, do companheiro angolano elista, do diretor do Elos de Uberaba, que partiu. Falar de Nsungu Castelo.
Temos pena que nem todos os que contigo conviveram, tenham levado em conta o que sabias, a tua herança africana, o teu domínio de várias línguas angolanas, além do francês e do português. A tua infinita vontade de estudar. Deste o exemplo a teus filhos, Cristiane, Zola, Keto e Nsungu Felipe, finalizando o curso universitário na UNIUBE. O teu coração sempre aberto ao bom convívio com amigos e família. O teu modo de estar “tão” angolano, e “tão” brasileiro. São o mesmo povo, não é verdade? P rincipalmente o de Minas Gerais (www.senhoradosol.com.br/texart21.htm), onde as línguas africanas mais faladas sempre foram as do grupo bantu, originárias de Angola. Temos pena que nem todos tenham levado em conta a tua verdadeira dimensão humana. Mas, como vês, alguns gravaram o que de melhor sabias: teus filhos, tua companheira de muitos anos, a Rosa, e teus amigos. “Uberaba perdeu muito com a tua partida” , desabafou o jovem uberabense Daniel Cunha.

depoimento@de.um.imigrante
“A cultura angolana está sendo ameaçada de extinção”, disseram-nos Nsungu e Rosa, no P rograma “Em português que a gente se entende” (ww.ldc.com.br/iclas). Em primeiro lugar, por causa da modernização e da civilização ocidental, sem contar com a influência do cristianismo e as descobertas do próprio ser humano. Em segundo lugar, podemos citar as conseqüências da guerra prolongada; as pessoas perderam a liberdade que elas tinham nas aldeias, para enfrentar uma vida totalmente oposta à tradição. E o casal angolano afirmou que “além, de que assim como nós , muitos angolanos vivem agora fora do país”. P ara Angola isto representou a fuga de gente qualificada, não fosse o tempo de guerra, a falta de oportunidades de trabalho e as precárias condições da educação, saúde e habitação.

familia@um.valor.importante
Em Angola, o nome é dado à criança em grande parte em homenagem a alguém e, por causa disso, essa criança recebe o tratamento do proprietário original do mesmo nome. Segundo o Nsungu e Rosa, “o primogênito recebe, em geral, o nome do pai ou do avô paterno , ou da avó paterna , se for menina . No caso de xará do pai , ele é chamado “papa fioti” ou seja “pai pequeno”, que quer dizer paizinho”. Família para os angolanos é um valor importante. Nsungu explicou que quando a criança chega na idade de poder sair de casa, por volta dos três meses, os pais a levam a casa do chará, para a apresentar. E com eles levam um galo vivo, um terno, roupa feminina, saco de “macoca” (que significa mandioca fermentada na água); mas além do termo “macoca”, existem outros como “makesso”, plural de “kesso”, bombó para fazer fubá (farinha de mandioca). Oferecem, também, bebidas, calçados, lenços de cabeça, esclareceu a Rosa. “O bebê recebe do chará vários presentes como roupas, e se ele tiver boas condições materiais, oferece presentes para os pais do bebê. Até uma certa idade, a criança pode viver com o chará dela”, contou Castelo.
Sobre a família angolana, Nsungu, definiu-a como “grande”. Acrescentando que “se compõe do chefe da família, o pai, a mãe, filhos, tios e sobrinhos; todos com os mesmos direitos dos filhos; e a ajuda familiar estende-se a todos os componentes”.
Obrigado Nsungu pelo teu exemplo de vida. A família elista não esquece.

* engenheira agrônoma e membro do Elos Clube de Uberaba

Fonte:www.jornaldeuberaba.com.br/