Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


10-09-2021

Jorge Sampaio, o meu testemunho  por Artur Pinto  e a lembrança de uma “efeméride” de 1962


 

Este  Artur Pinto <diadoestudante@gmail.com>  do qual hoje  partilhou um artigo , foi um dos organizadores da comemoração do Dia do Estudante  1962,  em 2012 , quando também o Jorge Sampaio esteve presente. Por isso agora ele me escreveu de novo! E recordo que tenho o livrinho, mas não sei se cheguei a digitalizar para partilhar com quem me pediu , e que me foi oferecido em 2011, pelo prof agrónomo José Eduardo Mendes Ferrão, agora com mais de 90 anos »»

O titulo deste folheto é "Carta dos estudantes expulsos à universidade", Março de 1966 amnistia para os estudantes expulsos, 39 páginas.  No Apêndice I  deste livro, na  Relação dos Estudantes Punidos( 181 estudantes), lá está o meu nome, Maria Margarida Dias da Silva,  e de outros colegas de agronomia. Cito os nomes dos colegas de agronomia: António Melo, João Duarte Silva, Vitor Louro de Sá, Manuel Portela, Francisco Baptista, João Matos Silva, Maria do Pilar Garção e Carlos Morais. Julgo que fui a única dos "punidos" que frequentava então o último ano de agronomia(5º ano)! Na altura da punição, todos os professores do ISA, me convidaram para assistir às aulas na mesma, e eu não perdi o ano! Memórias que convém não esquecermos!

 

 Assunto: Conjunto de panfletos anunciando as diferentes actividades previstas para as comemorações do Dia do Estudante em 24, 25 e 26.MAR.1962. Data: Março de 1962 Fundo: DAP - Documentos Artur Pinto 

Friday, September 10, 2021, 03:20:14 PM GMT+1

Jorge Sampaio, o meu testemunho.

 

"Estou aqui por ti, só tu me farias vir" por Artur Pinto

Hoje, 10 de setembro de 2021, a uma semana de completar 82 anos, deixa-nos Jorge Sampaio. É um dia particularmente triste para todos nós, seus companheiros de geração e de luta contra a ditadura. Deixa-nos um homem que foi o símbolo maior de uma geração, da nossa geração, que todos nós conhecemos como figura cimeira da Crise Académica de 1962, onde desde logo revelou as suas capacidades de diálogo e conciliação entre as diferentes posições reinantes no Movimento Estudantil. Atrevo-me a dizer que terá sido a primeira experiência do que, mais tarde, se viria a chamar de geringonça. É que, já na altura, e ao contrário do que muita gente pensa, a unanimidade não existia por força das sensibilidades políticas já, então, existentes e que, no fundo, eram as mesmas que se viriam a revelar após 1974, com excepção dos anarquistas: estas ideias, como as comunistas, as sociais-democratas, as dos católicos progressistas, e, até, as dos republicanos eram partilhadas por muitos dos dirigentes e dos militantes do movimento estudantil. E a unidade na acção só foi possível, em grande medida devido à capacidade conciliadora, construtora de pontes, de Jorge Sampaio, enquanto Secretário-geral da RIA. Mas já em 1959 o seu nome constava da célebre carta que 400 estudantes das três universidades dirigem a Salazar pedindo a sua demissão, uma vez que consideravam que a autonomia universitária não era possível num regime de ditadura. Episódio que é muito ignorado e em que todos os seus assinantes foram proibidos de exercer funções públicas. E na Greve de Fome de 1962, é ele quem se dirige ao major Mota Veiga, comandante das forças policiais, e lhe diz que, legalmente, ele não pode dar voz de prisão a todos os estudantes, mas que tem de o fazer individualmente, um a um. O que ele faz.

Jorge Sampaio, o "nosso" secretário-Geral da RIA em 62, nunca deixou de nos honrar com a sua presença nas diversas comemorações que levámos a efeito, mostrando sempre grande disponibilidade. Já com alguma dificuldade de locomoção, não deixou de estar presente num jantar na Casa do Alentejo, sendo obrigado a subir todas aquelas escadas até ao salão. À despedida, quando eu o acompanhava e o ajudava, diz-me só isto, que jamais esquecerei: "Estou aqui por ti, só tu me farias vir". E são estas palavras que eu hoje lhe devolvo em sentida homenagem.

Pela sua envergadura moral e cívica, pela sua clarividência, coerência e coragem políticas, e pela sua empenhada cultura humanista foi, também, um homem que honrou os cargos que ocupou, engrandecendo o país.

Ficámos mais pobres.